Em ‘MAIS PESADO É O CÉU‘, depois de acolher uma criança abandonada, Teresa conhece Antônio e os dois iniciam uma jornada pelo sertão. Com um futuro repleto de incertezas, nasce uma amizade em meio a uma luta pela sobrevivência.
Dirigido pelo cineasta cearense Petrus Cariry (Clarisse ou Alguma Coisa Sobre Nós Dois), o drama “Mais Pesado é o Céu” acompanha a história de Antônio (Matheus Nachtergaele), um cearense que resolveu retornar para sua cidade natal depois de anos morando em São Paulo, aonde se sustentava com pequenos bicos antes da pandemia diminuir suas oportunidades. Não demora muito para que o caminho dele se cruze com o de Teresa (Ana Luiza Rios), uma antiga colega da agora submersa cidade.
A situação se complica ainda mais quando Teresa encontra um bebê abandonado em um barco. É fácil se envolver com a situação de Teresa e Antônio. Ambos tentam encontrar em si uma fagulha de força e resistência em meio a inúmeras adversidades que se revelam naquele terreno hostil, não só através da natureza inóspita, mas também por conta dos diversos predadores que rondam a estrada. O bebê de origem misteriosa que Teresa encontra acaba tomando uma aura simbólica nessa jornada. Um verdadeiro milagre encarnado que acabou brotando na aridez do sertão.
A trama tem fortes ares de road movie, investindo forte no realismo social ao passo que não descarta a inclusão de elementos mais fantásticos. A cena em que Teresa encontra o bebê abandonado no barco parece remeter a história de Moisés. Tanto Antônio quanto Teresa se movem no decorrer da história como fantasmas. Ambos parecem estar totalmente desgarrados da vida que deixaram para trás, não possuem parentes vivos nas redondezas e são munidos apenas de planos vagos para o futuro.
A casa que acaba alojando o trio é repleta de rachaduras, poeira e retratos de estranhos que já morreram. Cariry que também assina a direção de fotografia, que se torna um dos maiores trunfos do longa. O sertão se tornar mais um personagem nessa história. Os planos abertos valorização a imensidão da natureza e ajudam a revelar as frustrações e opressões sociais que atingem os protagonistas, além de potencializar a sensação desorientação que ambos têm sobre o que os seus respectivos futuros.
É interessante observar como em diversos momentos Antônio, Teresa e o Bebê permanecem em cantos distintos do plano, reforçando ainda mais a marginalidade daquelas vidas. Em outras cenas Antônio e Teresa parecem estar separados por pilastras e faixas no asfalto, trazendo à tona o quão conturbado é esse processo de conexão entre pessoas que foram unidas pelo acaso.
Essa geografia visual é fluida e evolui conforme os personagens passam a se conhecer mais. Matheus Nachtergaele mais uma vez entrega uma bela performance. Seu Antônio é uma figura ambígua. As vezes empático, em outros momentos um tanto passivo e até um pouco aproveitador. Mas Nachtergaele costura todas essas facetas e incoerências de uma maneira que fica impossível não se enxergar pelo menos um pouco naquela figura e na sua trajetória marcada pela rejeição.
A Teresa de Ana Luiza Rios (A Filha do Palhaço) é igualmente complexa, uma mulher resiliente que mesmo com medo se expõem a diversos perigos para se sustentar. O roteiro não abre espaço para julgamentos morais rasos. Existe apenas empatia por aqueles personagens que em meio a miséria resolvem abandonar sua própria dignidade em troca de mais um dia de vida.
“Mais Pesado é o Céu” pode parecer filme sem rumo para alguns, assim como a jornada de seus protagonistas. É uma história sobre percorrer essa estrada árida da vida, uma história que continuará por muito tempo mesmo com a chegada dos créditos finais. Somos convidados apenas a contemplar um fragmento dessas três vidas, e talvez até sermos transformados pelas suas dores e marcas durante esse breve período.
NOTA FINAL
4/5
★ ★ ★ ★
Autor: Raphael Aguiar
Ficha técnica
Título: Mais Pesado é o Céu
Ano de Lançamento: 2024
Classificação Indicativa: 16 anos
Duração: 1h 38m
Sinopse: Teresa e Antônio, após acolher uma criança abandonada, percorrem estradas enquanto revisitam memórias de uma cidade submersa.