CRÍTICA | FAMÍLIA
Uma noite, um jovem brasileiro que mora no Japão invade a casa de um humilde artesão durante uma fuga. À medida que eles se conhecem, ambos descobrem outras formas de laços familiares que transcendem nacionalidade.
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A discriminação que surge com as barreiras linguísticas aparenta ser um terreno fértil para dramaturgia. O drama “Família” tem no seu núcleo o desejo de revelar o difícil cotidiano daqueles que fazem parte de diásporas brasileiras localizadas no Japão – também conhecidos como nipo-brasileiros. A história é formada por dois grandes núcleos dramáticos. De um lado temos o humilde oleiro Seiji (Koji Yakusho). O filho de Seiji, Satoru, é um engenheiro que visita o Japão com o intuito de apresentar sua noiva Nadia (que ele conheceu em uma usina na Argélia) para sua família.
Do outro lado temos Marcos, um jovem nipo-brasileiro cujo pai cometeu suicídio assim que sua família havia migrado para o Japão. Marcos vive com outros imigrantes brasileiros em um conjunto habitacional na periferia. Os problemas começam quando a gangue que Marcos que faz parte acaba criando atritos com poderosa gangue japonesa que comanda o tráfico e prostituição daquela área. A partir daí os mundos de Seiji e Marcos iram colidir de maneiras inesperadas.
O título “Família” já deixa claro que uma das principais perguntas dessa história é sobre o que de fato forma uma família. Pessoas de diferentes países, com diferentes línguas e até mesmo sem nenhuma ligação sanguínea podem compor uma família. Em um determinado momento Marcos diz: “Quem somos exatamente, quando não podemos ser nem japoneses nem brasileiros?“.
“Família” busca investigar essa formação de identidade que nasce da mistura de duas culturas tão opostas. É sobre aqueles que nascem nesse entre-lugar. Sobre comunidades e indivíduos que reeditam suas tradições enquanto questionam esse pertencimento.
A relativa escassez de filmes que se dedicam a explorar como é a vida no Japão para imigrantes e refugiados – principalmente daqueles que não são das nações ocidentais brancas – acaba trazendo um certo ar de frescor para essa produção. Com exceção do grande Koji Yakusho e de Ryo Yoshizawa, praticamente o resto do elenco jovem é composto por atores japoneses é nipo-brasileiro sem experiência em atuação. Essa escolha traz uma sensação de autenticidade para narrativa.
A mistura desses dois núcleos nem sempre é satisfatória. Durante a maior parte da produção chega-se a ter a impressão de que esses dois lados são na verdade dois filmes distintos. O núcleo de Seiji evoca um tom mais introspectivo e sensível de um drama familiar japonês, no melhor estilo “Dias Perfeitos”. Já o núcleo de Marcos é uma explosão de caos que mais se aproxima de um filme policial crime. Tudo nesse núcleo acaba destoando de tão estilizado. Não que seja uma história menos interessante.
Tanto Marcos quanto Seije são complexos. O único problema é que ambos parecem fazer parte de universos paralelos em alguns momentos. Os minutos finais de “Família” se dedicam a amarrar todas essas pontas com mais coerência.
“Família” certamente terá um gostinho especial para os espectadores brasileiros. Esse modesto drama cria um retrato complexo da natureza precária da vida dos imigrantes. Os episódios de desumanização de estrangeiros e a forma como o crime organizado explora a população marginalizada certamente são próximos da nossa própria cultura. Uma história cheia de empatia cujo desejo por conexão faz o público releve seus percalços narrativos.
NOTA FINAL
3,5/5
★ ★ ★
Autor: Raphael Aguiar
Agradecemos imensamente a Sato Company pelo convite!
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